segunda-feira, janeiro 26, 2004

Acordado para a vida.

Essa semana estava no serviço, enrolando e tentando lidar com uma ressaca daquelas, quando zapeando na Net, cortesia de um colega separado que não tem onde enfiar a antena, me deparei com um filme simplesmente absurdo. Waking Life.
Todo em animação sobre filme digital, com os mais variados estilos e leituras dos personagens, conta a história de um cara que fica preso em seus sonhos, incapaz de acordar, que começa a questionar a própria existência dos sonhos e da realidade e da vida e por aí vai. Esteticamente lindo e intelectualmente inquietante. Você precisa assistir.
Talvez pelo gosto de toda aquela tequila ainda estar na minha boca, e do zumbido em minha cabeça, o filme me pareceu hipnótico e todo aquele caos e a incerteza de estarmos vivendo em mundo real ou imaginário me tornaram algo letárgico e confuso.
Perspectivas para um estilo de vida moderno:
A bebida e as drogas não nos levarão a lugar nenhum,pois nossos pais continuam aqui e eles beberam e usaram tantas drogas como nós; Será que foi por isso que eles ficaram assim?!
O suicídio levou os justos e racionais, e eu já falei sobre isso, não vou me meter nessa de novo. Me tornei muito obtuso e simplista para me matar, não tenho mais tanta subjetividade.
Somente uma insistência em questionar as coisas, um mania neurótica de querer fazer as coisas do meu jeito, ou pelo menos com minha permissão. Uma vontade de mudar de novo, de começar de novo e de me entregar...sem agústia existencial.
Só me resta um desejo de abraçar o Caos, sem objetivos diretamente lucrativos, sem previdência privada, sem roupa de marca, sem casa na praia e sem a porra do carro do ano.
Chet Baker continua tocando My funny Valentine no meu cd, vou fumando uns cigarros fedorentos e bebendo só pra brincar de suicída; acordado para a vida e distraído para a morte.
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segunda-feira, janeiro 19, 2004

Amenidades.

Descobri mais uma mulher que eu adoro: Clarah Averbuck. Ela é simplesmente demais, linda e louca, completamente rock´n´roll!!! Vocês precisam conferir o ex-blog dela que está linkado aqui e seu primeiro livro, uma alto biografia disfarçada de romance chamado Máquina de Pinball, muito engraçado, muito irado e é tudo de bom mesmo.
Clarah eu te adoro!!!
Estava ouvindo Interpol e eles também são bons demais, e é o tipo de banda que sempre quis ter, músicas tristes com ótimas letras e super bem vestidos e com aquele ar blasé, cheios de tédio; mas com esse nosso clima tropical não dá. Como ser blasé e tristonho de shortes e camiseta, suado? Não dá, cara, já tentei mas não dá mesmo...só em Nova York ou talvez Londres, no frio e com cachicol. Meio Bob Dylan meio Albert Camus.
A bebida tem me proporcionado bons momentos de entretenimento e diversão, e embora já me tenham acusado de alcoolatra, não levei isso como uma ofensa pois na verdade venho cultivando o hábito de beber já há uns dois anos e somente agora consigo ficar legal sem pagar mico geral, como zoar com a mãe dos outros e chamar o anfitrião de mentiroso e essas coisas que fazemos quando estamos além da zona do crepúsculo, só escapei de beijar mulher feia, pelo menos até onde me lembro, mas fiz xixi no colchão da Gabriela, foi mal...
Preciso escrever para os meus amigos, preciso ligar para os meus amigos, preciso de novos amigos. E dizem que preciso de objetivos na vida e de uma visão de carreira mas isso não tem a menor relevância atualmente, estou por aí, simplesmente vivendo, tentando me divertir um pouco e talvez alcançar a iluminação pelo bem de todos os seres.
Om Mani Padme Um...e o resto que se dane...!
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sexta-feira, janeiro 16, 2004

Um ano e quatro meses.

Rachel o amava de verdade. Agora que a distância se tornara uma barreira intransponível entre eles, ela se lembrava de Samuel e sentia amor, mais do que saudade, naquelas noites frias em São Paulo.
Ele é um poeta, ela dizia para as amigas, embora nunca tenha escrito uma linha sequer, ele tem uma alma de artista, completava enquanto se lembrava da maneira com que ele olhava a chuva com alegria e se emocionava com cachorros vadios, os chamando de filhos e lhes dando comida de seu próprio prato.
Samuel era afeito a indignações das mais profundas e eloqüentes e Rachel as ouvia pacientemente fumando seus cigarros, enquanto ele fazia discursos e se virava contra a maldade e apatia dos “homens de bem”, e lhe contava de seus pequenos planos e vinganças, como da vez em que fez xixi na escova de dente de um escroto do trabalho e dos doces que roubara de outro pulha para levar de presente pra sua mãe, cocadinhas de leite; um rebelde com o coração de ouro é o que Rachel pensava sobre ele. Tão bom e tão incapaz de realizar as mais simples tarefas do dia-a-dia, sempre ocupado indo ao fundo de tudo.
Talvez fosse por isso que às vezes Samuel se calava, se tornava apático e entediado, como ele dizia, e ela percebia aquele brilho gelado em seus olhos o deixando de lado até que passasse.
Ela já não o visitava há sete meses, mas de alguma forma sabia que ele estava bem pelas cartas que trocavam pelo menos duas vezes ao mês, e para ele assim estava melhor, sentia menos saudade sem vê-la. Mais uma de suas loucas contradições.
Na última vez em que se viram, ela lhe perguntou o porque, após estar tomando coragem por dois anos, e ele disse que foi pelo tédio que aquelas rudezas do comportamento humano provocam nele, simplesmente me encheu o saco, ele disse justificando o espancamento que o juiz entendeu como tentativa de homicídio por motivo fútil. Aquele homem gordo, velho e podre nunca mais ia andar direito, se andasse.
Faltavam agora um ano e quatro meses para que ele voltasse e se quisesse vir para São Paulo morariam juntos, ela e aquele louco que tanto amava.
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quarta-feira, janeiro 14, 2004

Eu queria ser um Tenebaum.

Existe um filme que me toca muito, Os Excêntricos Tenenbaums(assim no plural), e ontem eu o assisti, acho que pela décima vez, com o mesmo entusiasmo e alegria de sempre, bebendo um espumante e em boa companhia( ela só temia que eu ficasse sorumbático, suas palavras, após o filme; não fiquei).
Mas como sempre me ficou aquela sensação: Eu queria ser um Tenebaum!
Não um dos personagens maravilhosos do filme, mas eu mesmo só que Tenebaum.
Ser uma alma perdida, marcado pela desgraça e pelo fracasso, um impostor, um perdedor irresistível e embalado por uma trilha sonora irretocável, é o que eu chamo de perfeição.
Sempre tive essa atração pelas "Almas Perdidas", uma sina que persegue minha famíla há pelo menos cinco gerações, esse amor pelo torto, uma queda pelo marginal e uma irrestível atração pelo abismo. Acho que é essa mistura de sangue judeu/russo/cigano que nos deixou assim meio tortos também.
Por isso as vezes me chamo Augusto Tenebaum e posso fazer o que quizer, ser obsceno, genial e sacrílego, amar a vida e declarar isso aos berros enquanto planejo meu suicídio para o dia seguinte.
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quarta-feira, janeiro 07, 2004

Saudades de mim mesmo.

Lá fora chove, e aqui dentro tudo continua como sempre, quente e lento.
Sei que alguém sente falta de mim, em algum lugar, e sei que talvez ela esteja melhor sem mim. Menos preocupada e mais leve, livre de meus fantasmas, minhas neuroses e minhas histórias bárbaras sempre a assombrá-la, talvez esteja pelo menos mais alegre sem mim.
Algumas vezes a vi chorar e se lamentar, e sei que que era minha culpa, não completamente, mas me pesava como se fosse; sempre assim, com um mundo nas costas.
Sei também que no fundo ela nunca mais chegue a ser uma pessoa feliz, já que algumas feridas não cicatrizam jamais. E isso eu fiz, marcas profundas como tatuagens, uma para cada dia infeliz e para cada lágrima em vão, lenta e quente como esta noite desesperada.
Mas sei que ela sente falta de mim.
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segunda-feira, janeiro 05, 2004

Só termina quando acaba.

Tudo voltou a fazer sentido de repente, em forma de dor e um cheiro de pólvora e sangue. Aquele infeliz havia lhe dado um tiro, bem ali em seu quarto, após tanto tempo e por tão pouco. Mal podia se lembrar agora de quanto lhe devia, mas não era nada comparado com o sacrifício de aturar seu jeito grudento e asqueroso por tanto tempo,aquele merda viciado em speed. E Daiane estava com ele agora...que se dane.
Não estava triste, apenas achava estranho morrer daquele jeito, naquele quartinho alugado sem a menor personalidade, mas não deixava de ser algo engraçado, melhor irônico, terminar assim depois de todas as loucuras e drogas e merdas que tinha feito naqueles vinte e oito anos de vida, tinha até um emprego e um salário agora. E Daine ainda gostava dele, ele sabia, mas ela gostava mais de cocaína, ele também sabia.
Sirenes estavam chegando, ele podia ouvir seus sons nervosos, e algo se moveu dentro dele, algum apego e algo de afetuoso por aquela vida comum, cotidiana e previsível. Seu sangue era muito vermelho e saía quente de sua barriga,mas ele sabia que não iria mais morrer, quer dizer, não naquele quartinho alugado, naquela noite abafada e sem graça.
Quando os paramédicos chegaram com seus aparelhos e códigos sentiu-se lisongeado por toda aquela atenção e cuidado, e eles lhe pediam calma e diziam
"Força rapaz, tudo vai acabar bem..."
E ele sabia que talvez nem tudo terminasse bem, mas viver era bom.me envie um e-mail