terça-feira, novembro 07, 2006

Qualquer novo começo é um bom começo.

Tudo ia acabar bem.
Cláudia sabia disso desde o princípio, desde sempre.
No momento em que ouviu o tiro e sentiu o sangue espirrando tudo ficou escuro, e dolorido e vazio. E tudo ficou claro.
Se lembrou de tudo, como nos filmes e romances onde a vida passa como num filme, e ficou pasma de se ver neste tipo de situação, achou graça na verdade. Apesar da dor e do medo mais intenso e verdadeiro que sentira na sua vida, começou a rir.
Lembrou-se de seu pai indo embora e da confusão e da culpa que aquele vazio lhe trouxe. Sua mãe tão confusa quanto ela, ao seis anos de idade, e todo o rancor e falta de carinho que sempre fizeram parte de suas relações.
Lembrou-se dos primeiros amores, das bocas lhe mordendo e dos músculos e do suor. O sexo como um oásis, uma redenção de todas aquelas dores, até isso se perder também.
Lembrou-se das drogas e da euforia e da necessidade cada vez mais sufocante por mais, sempre mais. E não sabia mais quem era, perdida entre os homens, sexo pago e suas drogas. Ela havia se tornado isso até aquele dia, uma marionete viciada em speed e cocaína.
Mas sempre houve aquela luzinha no fim do túnel, tudo ia dar certo um dia.
De repente sentiu o peso daquele homem gordo e colante sobre ela, sentiu o gosto de sangue e seus olhos estavam ardendo pela pólvora que turvava tudo a sua volta, mas o cheiro era bom, só o cheiro intenso de sangue que lhe enjoava um pouco, talvez nem tanto pelo sangue mas pela possibilidade de ser seu sangue.
Com esforço tirou aquele peso de suas costas, rolando-o para o lado e viu que ele não tinha mais cara, somente um amontoado de cabelo, carne e sangue. Era curioso que aquilo fosse um ser humano, curioso.
Uma dor aguda surgiu em seu pescoço, um estilhaço de bala devia estar preso ali, e seu supercílio direito sangrava muito, a pancada no chão deixaria uma cicatriz em seu rosto magro.
Ninguém se mexia, umas dez pessoas caídas em posições grotescas empapavam o chão com sangue e um cheiro estranho de morte, o único som que ouvia era o zumbido em seus ouvidos, causado pelo tiro a queima-roupa na nuca do gordão que a havia segurado como um escudo contra os matadores, o que ele não contava era com um terceiro homem as suas costas, bem feito. Que tipo de covarde usa uma mulher como escudo?
Cláudia pegou o dinheiro que não lhe serviria de mais nada e até sentiu pena daquele homem, isso após lhe dar um forte chute nas costelas, covardão.
Saiu andando meio tonta sobre o vidro quebrado, os corpos e do sangue que grudava em seus sapatos com saltos altos demais. Viu sua imagem em um espelho no meio do bar e se admirou com o que viu ali, nunca estivera tão bonita, com um olhar tão claro, talvez em algum lugar da infância aquele olhar tenha existido. Seus cabelos estavam grudados com sangue e pequenos pedaços de coisas que ela não queria saber o que eram, seu rosto estava sujo e machucado e seu vestido um trapo, mas alguma coisa de novo havia ali, uma leveza, um brilho, uma liberdade.
Era o melhor dia da vida de Cláudia, e ela estava feliz.
Tudo estava bem.

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quarta-feira, outubro 25, 2006

Fumaça

Chovia fino, aquele friozinho desgraçado começava a apertar e do outro lado da rua em um turbilhão de pensamentos, nosso singelo casal embarcava.
Pernas apressadas que transitavam pela rua perdiam alguns segundos a observar aquele casal comum.
Ela encostada no muro sujo e fedorento, e ele quase sentado no chão coberto de um enlodado-verde-viscoso diante da fogueira.
Ambos hipnotizados.

Ela desejando que o fogo lambesse sua perna, ou ao menos parte dela, apenas para ter certeza de que aquele momento era real, para tentar impedir que justo esse turbilhão não se unisse ao misterioso mundo de suas memórias distorcidas.
Ele não se contentava em encostar seus sapatos sujos de terra no fogo, queria tocá-lo, queria senti-lo dentro de sua mão, impedindo que mais uma vez sua memória distorcida se apoderasse de sua mente. Mais ainda, queria provar para Julia que aquele turbilhão todo era real, que o fogo era real, e que o desejo de queimar era ainda mais real.
Lembrava-se de sua infância, ao admirar o fogo.
Desde os 6 anos de idade carregava em seu pequeno-quase-furado bolso: um canivete, um potinho de álcool, um isqueiro e uma caixa de fósforos cheia pela metade, roubada da cozinha de sua aflita mãe – para evitar que o maldito isqueiro o deixasse na mão. E havia pelo menos uns 9 anos que não queimava nada. Ou quase nada.

E o que faziam ali? As pernas apressadas se perguntavam.
Queimavam.

Queimavam relíquias de outrora, bobagens, presentes, restos, lembranças, quinquilharias; queimavam coisas importantes-sem-importância, coisas sem-importância-importantes; queimavam suas vidas.
Mas ele está lá: impresso no peito. Às vezes grita, às vezes misericordiosamente se cala. O passado.
É a lambida do fogo na perna da menina. É a queimadura na mão de Gabriel. E não se consegue escondê-lo. Nem que se deseje com todo fervor. No entanto, acreditem, o terror pior é jamais ser descoberto.

E a chuva fina teimava em não conseguir apagar o fogo, enquanto a fumaça perseguia nossos adoráveis desconhecidos. E se cada um estivesse de lados opostos, a fedida fumaça conseguia sorrateiramente se bifurcar, atormentando os dois.
Mas ambos sabiam que não estavam verdadeiramente atormentados. Esse era o papel da fumaça.
Enquanto Julia olhava a sutileza mágica da fumaça ao se misturar, no céu cinzento e solitário, com a suave e doce névoa do fim da tarde, imaginava – e sabia – que nenhuma daquelas pernas seria era capaz de ver tamanha beleza.
E se lembrava da frase de Scooter: “Bill, o fogo lava as coisas”.

Talvez lave, talvez esconda, ou disfarce, ou quem sabe destrua o que ainda não conseguiu existir ou o que deixa de existir neste derradeiro momento.
Tinha medo de que a árvore pegasse fogo, não era nenhuma defensora da natureza, achava baboseira essa coisa de green peace, mas não queria que a árvore se incendiasse. Era bela demais para isso, além de não ter culpa alguma na história. Talvez nem toda culpa seja vã. Pensava.

E a chuva resolveu apertar, só para molhar seus cabelos ensebados e suas cansadas japonas. Mas não ousavam se intrometer com a simpática fogueirinha. Esta queimou até o fim.

Ela via seu coração queimando na fogueira.
Ele queria que ela o visse se queimando.
Ainda queimavam.
Forever and a day...

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sábado, outubro 21, 2006

Le couple de la bonne fortune.

...Há alguma coisa nela que me inquieta, algo de grande, profundo. Não entendo bem o que seja, então me calo e observo...


Após um ano as coisas mudaram, e talvez só tenham mudado porque tudo mudou, uma coisa levando a outra nesse mar de clichês surpreendentemente reais.
Mas como todo o resto, a mudança foi anterior a si mesma. A “vida perfeita” já havia começado antes dela se avizinhar, mas não era uma vida perfeita dentro dos limites do cotidiano, do ordinário. Tudo era ainda confusão, tumulto e loucura, mas com uma aceitação profunda de seus limites, de suas nuances mais estranhas. Então era a vida FerPeita, com a perfeição de ponta-cabeça!
A ponto de mudar até meu MONDO FANTASMA, pois agora terá a participação de Luiza Peixoto em suas linhas tortas, porém sempre sinceras.
Assim são seus contos, preenchidos de intensidade, sinceridade crua e lirismo, um reflexo de sua autora. Uma imagem no reflexo de sua vida, as coisas estão todas lá, mas às vezes em lugares aonde você não pensaria em procurar.
As coisas sempre estiveram certas, sempre no seu lugar certo, mas a boa sorte agora me acompanha, a mim e a essa mulher que tanto amo.
Somos o casal da boa fortuna embalados pelo desejo profundo da felicidade, embalados por Dry Martinis, embalados por sambas velhos e algum jazz cheio de metanfetaminas e paixão.
A vida já era boa, agora está melhor.

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domingo, julho 02, 2006

Cinco condições para ser um pássaro-cão solitário:

1. Manter o bico sempre apontado para cima
2. Uivar para a Lua sempre em seu ponto mais alto
3. Não ansiar por companhia nem de sua pópria espécie
4. Não ter cor definida
5. Ter o canto mais suave.
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quarta-feira, junho 21, 2006

A flor.

7:00h, am. O relógio desperta no criado mudo.
“Saco”, pensa Vinícius, o primeiro pensamento do dia, e que se repetirá muitas vezes até que se deite de novo, e lhe ocorra pela última vez antes de pegar no sono. O despertador lhe irrita com aqueles bips monótonos que vão ficando mais altos a cada repetição, feitos para não irritarem as pessoas. Toca o crucifixo em seu peito e ele está gelado e pesado, as paredes de seu quarto com pôsteres de filmes parecem menores e abafadas, mais um dia como qualquer outro.
O café da manhã é rápido e aborrecido, pois sua mãe já está acordada a algumas horas, ouvindo uma rádio de fofocas de novela e com uma roupa de ginástica que lhe fica no mínimo ridícula. Mas todas aquelas anfetaminas devem estar afetando seu cérebro ávido por dietas milagrosas e receitas imbecis.
Ela fala o tempo todo, sobre qualquer coisa, não importa.
Vinícius faz cara de interessado, e boceja enquanto acaricia sua cicatriz sobre o supercílio direito, que lhe deixou uma falha na sobrancelha. Fora um milagre todos disseram, Ter sobrevivido ao acidente. Pois bater de carro com tudo, em uma parede de pedra, ficar cinco dias em coma e passar por uma cirurgia no cérebro, sem Ter seqüela alguma além daquela que o faz se parecer com o Vanilla Ice, era um verdadeiro milagre. E todos fingiram que foi um acidente, e nunca mais tocaram no assunto, e isso foi o suficiente para que ele também não dissesse mais nada a respeito. Tudo continuava como sempre.
O caminho até a faculdade era rápido e sem surpresas, e ele caminhava apenas interessado no canto dos pássaros que ele nunca via, lhe pareciam fitas tocando repetidamente, e essa idéia o divertia.
Estudava história em uma federal e isso era sinal de que seus companheiros de turma eram alguma coisa entre hippies de butique e intelectuais de esquerda filhos de industriais. Poucos se salvavam e ele fazia questão de usar sua camisa “KILL ALL HIPPIES” para mantê-los afastados e era isso o que faziam.
Seu único amigo era Marcelo, que assim como ele não era o senhor popularidade, sempre com barba por fazer e meio curvado. Mas era o único que o fazia rir e tocava violão muito bem, apesar de ser fraco para bebidas o que o desqualificava para ser um verdadeiro boêmio carioca, pois sempre vomitava, um vexame.
Suas conversas eram sempre discretas, porém era divertida a maneira com que Marcelo sempre tentava animar Vinícius com suas histórias malucas sobre paixões relâmpagos e porres de três doses de qualquer bebida destilada, eram amigos embora não se conhecessem a fundo e não freqüentassem as casas um do outro. Ele era o único que sabia a verdade sobre as cicatrizes de Vinícius e sobre seu humor e suas dificuldades.
A novidade da semana era a seguinte, Marcelo estava enlouquecido por uma menina da turma, Clarissa, e não fazia nada além de pensar nela nas últimas três semanas, mas sua falta de jeito com as mulheres o mantivera longe dela. Era uma menina bonita, muito bonita na verdade, com cabelos pretos longos demais, um pouco desgrenhados e olhos azuis brilhantes sobre lindas olheiras, o problema é que apesar do corpo bem feito sempre parecia desleixada, pois suas roupas não lhe caíam bem, por pura afetação pensava Vinícius, pois a vira em uma festa certa vez e ela parecia bem natural com um vestido longo e saltos altíssimos. Era o tipo “filha de hippies velhos”, e estava sempre com camisetas de lugares como Maromba, Trindade e São Tomé das Letras, um clichê ambulante e fingindo que não fazia questão de ser linda.
Naquele dia as coisas iriam mudar, pois Marcelo tinha uma surpresa para ela, que a faria cair de quatro por ele, uma idéia muito simples e antiquada, uma flor.
Vinícius sorriu e soprou a fumaça daquele primeiro cigarro para o alto, viu a sinceridade nos olhos do amigo e teve pena, pois soube que ele estava realmente convencido de estar apaixonado por ela, uma garota que nem sequer olhava pra eles.
Estava sentado em sua carteira coçando sua cicatriz quando olhando para o lado, viu sobre livros e uma bolsa esfarrapada uma rosa, perfeita e vermelha, sobre um envelope. Clarissa devia estar sentada ali e enquanto pensava sobre isso alguns idiotas, correndo e se empurrando, trombaram com a carteira da flor, jogando tudo no chão. Vinícius disse alguns palavrões e se abaixou para arrumar tudo, colocando tudo mais ou menos como estava anteriormente, ajeitou a flor sobre os livros e voltou a sua rotina, o olhar meio borrado e sua mão sobre a sobrancelha.
A aula iria começar, longas digressões sobre nada, distraidamente olhou para o lado e ficou surpreso em ver Clarissa, lhe olhando fixamente. Tinha a flor nas mãos e seu olhar estava fixo nele, dardejante e algo marejado. Vinícius ficou constrangido e desviou o olhar casualmente, fingindo indiferença, disfarçou um pouco e ao olha-la novamente a viu na mesma posição e ela definitivamente chorava. Que tipo de mulher louca ganha uma flor e chora?! Ele se perguntou, irritado, e era do Marcelo que ela deveria sentir raiva, pois foi essa a impressão que ele teve naquele momento.
O que ele fez foi ignora-la pelo resto daquela aula interminável e rezar para não tomar uma bofetada, pois poderia reagir e aí seria um caos completo. Mas ela se levantou prontamente foram dispensados e saiu da sala. Aliviado Vinícius relaxou a vendo sair com aquele andar agitado, e reparou que ela tinha de fato uma bela e redonda bunda. Virando-se de volta para o local onde ela estava sentada sentiu seu coração gelar quando viu que tinha se esquecido da carta, do envelope que estava sob a rosa e que estava agora sendo pisoteado por aqueles pregos. Pegou o envelope amassado do chão e quando pensava em sair correndo atrás dela foi seguro por Marcelo, com os olhos arregalados e suarento.
E aí? Ele perguntou, - E aí o quê? Respondeu Vinícius, escondendo o pequeno envelope em sua mão fechada.
Porra! O que ela fez quando viu a flor?
Sei lá, ficou meio bolada, acho que ficou foi é muito puta pois os olhos dela ficaram cheios de lágrimas, acho que chorou mesmo.
Caralho! Ela ficou emocionada seu verme! Tu não saca nada de mulher mesmo. E o bilhete?
Não sei...Não fiquei reparando cacete.
Deixa pra lá cara, agora é só esperar que ela tá no papo! Vamos beber pra comemorar.
E Vinícius foi arrastado por Marcelo até um boteco bem fuleiro que ficava logo ali perto e após duas garrafas de cerveja ele já estava chorando seu amor por Clarissa e contando como seria sua vida feliz ao lado dela. Vinícius ficou olhando para o amigo e enquanto sentia o bilhete amassado em seu bolso, não podia deixar de achar estranho alguém sentir amor e falar sobre isso de maneira tão natural, sentiu algo vazio em si e alguma coisa como uma pequena inveja se arrastou sob seus pés.

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sexta-feira, abril 21, 2006

Cinco passos para se tornar independente:

1. Arrume um emprego de verdade.
2. Pare de ligar para seus pais quando tiver sonhos ruins ou dor de dente.
3. Aprenda a beber sozinho.
4. Deixe de ser um preguiçoso.
5. Cuide de você mesmo como se fosse um bebezinho...
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sexta-feira, março 31, 2006

Uma coisa é uma coisa, outra coisa não sei.

Estava lendo o blog da Pamela Cabral, que a propósito é muito bom vide link ao lado, e ela falando sobre mulheres e nomes e Clarah Averbuk e tal, e estava pensando na minha própria vidinha, como somos centrados em nossos umbigos...
Mas enfim, me deu vontade de falar da minha vida e vou começar contando que vou permanecer no Rio, estou superando o excesso de asfalto, de violência e de pessoas mal educadas, na verdade, qualidade de vida pra mim agora é sair na noite e me divertir o tanto quanto tenho que estudar e trabalhar, vamos equilibrar essa balança. Já me habituei a falta de grana, aos tiroteios intermináveis entre os amigos do Morro da Formiga e do Boréu, e até a minha cama vazia, quer dizer pela metade pois eu continuo dormindo nela e bem por sinal.
Finalmente reencontrei velhos amigos como a Fabiana Bix e o impagável e louco Alexandre Portugal, pessoas alegres, inteligentes e na busca da vida, perseguindo o destino. Tenho saído simplesmente pra me divertir, na companhia de minha linda irmã Camila e temos realmente nos divertido a valer, nas situações mais simples e burlescas.
Tenho cuidado tanto de mim que perdi um pouco do “time” do outro, sem apatia mas com um interesse muito grande na minha própria tranqüilidade afinal.
Alguns amigos partiram, outros estão partindo, é a vida maravilhosa em movimento.
Uns loucos da Beat Generation(orkut) tem se mostrado as pessoas mais interessantes dos últimos tempos, uns caras corajosos, umas meninas lindas, pena que todos tão distantes, mas distancias estão aí para serem percorridas, pra serem caminhadas.
O Rio tem sido bom pra mim, meu trabalho tem sido bom pra mim, eu tenho sido o cara mais legal do mundo pra mim, então penso que estou no caminho certo, em algum caminho certo, de ele onde der...

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sexta-feira, março 17, 2006

Quando os urubus se tornam fragatas.

As vezes as coisas ficam estranhas, como um sonho que corre de trás pra frente, como o cardápio de um restaurante escrito em outro idioma, e fico esperando a visão das aves migratórias seguindo sua rotina secular, afim de me sentir seguro novamente, palpando algo real e vigoroso.
As vezes as coisas são tão vazias, que não temos nada com que contar, nada a que nos ater e é aí que tudo poder mudar, pois menos com menos dá mais.
Menos com menos dá mais!
É uma regra matemática, uma Lei da Natureza e com isso acho que podemos contar, nesse infinito de incertezas e impermanência
Uma mulher me dizia isso e eu pasmo nunca entendi, somente após o esvaziamento completo de minha mente cartesiana, somente após abandonar os velhos sonhos e me jogar nessa vida liberto eu pude compreender esse postulado tão básico e vulgar.
Mas o “tarde demais” é outra questão que se faz presente e contra a qual eu posso ousar me confrontar, pois assim como a matemática pode servir para guiar as viagens mais Lisérgicas Zen Libertadoras o próprio lapso temporal, a distância e todos seus relativismos podem ser o toque final em um relacionamento que fracassou, tristemente e me afastando de alguém sempre muito querida.
Uma pessoa, uma mulher que poderia Ter sido sim boa demais para mim, se tivesse tido vontade, mas que ficou a meu lado. Que não foi mais fraca do que eu, nem mais confusa mas que foi arrastada por minha loucura e se viu perdida nesse mar revolto e negro do meu coração.
Uma mulher que ouso chamar novamente.
Uma mulher que pode me renegar e me virar as costas, com toda a justiça de seu coração.
Mas uma mulher que não perderei jamais.
Não agora que não tenho mais nada...
Você foi embora, mas eu te peço agora,
vem comigo não quero ser sozinho...

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terça-feira, março 14, 2006

Cantiga de ninar.

Inquietos, inquietos como nós;
Sempre indo as profundezas de todas as coisas,
Buscando aquele algo superior que sabemos que existe em algum lugar, de alguma forma, mas onde?
Incansáveis, incansáveis como nós;
Sem deixar pra outro dia o desespero que pode ser vivido hoje,
Com a urgência das horas trazendo a morte pra dentro de nossas camas, grandes demais,
Moles/duras demais, manchadas de amores velhos e esquecidos.
Loucos, loucos como nós;
Sabendo que não há fim neste caminho só, por tudo que é belo e estético e capaz de nos fazer por um segundo apenas esquecer que não há nenhum sentido além do “ser”, sem niilismo, sem depressão, sem cocaína.
Desiludidos, desiludidos como nós;
Procurando pela linha invisível que nos separa, que nos torna diferentes e exóticos aos olhos dos trabalhadores e responsáveis acumuladores de bens, que nos joga a margem de um mundo perfeito e pelo qual sentimos tanto amor, mas que não nos acolhe, pois não é feito pra nós.
Inquietos, inquietos como nós;
Em homenagem a todos os heróis do passado, nossos heróis mortos, loucos poetas e bêbados, que já trilharam essas mesmas rochas e nos deixaram sinais discretos e precisos, às vezes traiçoeiros, mas presentes para quem os conhece.
È só isso que meu filho tem que aprender nessa família, precisamente isso.
Antes que o mundo acabe pra nós.

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sábado, janeiro 28, 2006

Uma pequena música noturna.

Estávamos deitados um ao lado do outro, nus naquela cama com os lençóis soltos, não importa o que eu fizesse, o tamanho ou a presença de elásticos, o lençol sempre saía e acabávamos deitados diretamente sobre o colchão. E ela sempre se irritava, mas não especialmente naquele dia.
Estava quente, havíamos transado e havia sido bom, muito bom na verdade. Suados e descabelados de frente um para o outro, eu ofegando um pouco e ela calma como um felino. Estava tocando Imogen Heap, bem baixinho, ela olhava pro meu peito e eu para seu rosto, com a face corada e pequenas gotículas de suor sobre o lábio, os olhos baixos e a respiração leve, quase imperceptível.
Você me parece muito doce, assim toda desarrumada.
Murmurei com a voz grave e preguiçosa.
Você me parece triste.
Ela disse baixo e me olhou diretamente nos olhos, com aqueles mais profundos olhos castanhos. Senti um bolo no estômago instantaneamente.
Que é isso? A gente acaba de transar como dois bichos e você me diz que eu tô triste?! Tá louca, menina...
Não é isso. Ela tornou a baixar os olhos, com os lábios vermelhos entreabertos.
Não agora, mas você me parece um homem triste. Eu fico tentando te entender quando você fica quieto olhando pro vazio; sei lá, me dá um pouco de medo, de solidão. Me lembra o meu avô quando estava no asilo.
Muito obrigado, eu respondi rindo, te lembrar seu avô é excelente!
Não é isso, seu bobo! Ela deu um pequeno, mas sincero sorriso que aliviou todo o peso que estava no meu peito.
Vocês homens são assim, quando são jovens querem dominar tudo a sua volta e agem como cachorros em eterno cio, uns babões. Querem foder o mundo inteiro e de repente quando envelhecem e deixam de ser uns completos boçais vão ficando tristes. Pelo menos os que conheci eram assim como você. E eu não consigo entender isso cara, e acabo me sentindo uma merda.
Terminou suspirando profundamente, o que fez seus seios balançarem de forma leve e delicada. Eu fiquei olhando para ela, em toda sua beleza e fragilidade, quieto e com uma expressão neutra, que eu sabia que fazia as pessoas erroneamente pensarem que estava de mau humor.
Nem todos são assim, no final das contas. Penso que somente os que se mantêm vivos, só os sobreviventes ficam assim. E não acho que isso tenha a ver com potência sexual, calvície e essas merdas de envelhecer. Sem sacanagem, sem melodrama, mas acho que isso é coisa de homem durão solitário. Você fica velho, se dá conta da solidão do mundo, fica mais calmo, calado e vai vivendo da melhor maneira que pode.
Lá vem você, senhor Clint Eastwood com espada de samurai metido a besta, Toshiro Mifune com chapéu de cowboy, debochou ela com cara de moleca contrariada.
Não é isso linda...
No fundo você fica se achando o charmoso assim, todo melancólico, falando baixo, e eu acabo caindo feita uma boba...
Ou isso, ou eu simplesmente li livros demais, assumi, e ouvi muita música triste. Eu penso que esse sempre foi meu problema, e muitos filmes de guerra também.
Ela se sentou, pegou um cigarro e jogou seus cabelos pro lado, deixando suas costas magras à mostra, suas costelas aparentes e a borboleta tatuada, em pleno vôo. Eu continuava memorizando todos os detalhes, sempre viciado aos detalhes.
Acendeu o cigarro de forma lânguida e ficou me olhando de lado, enquanto inalava a fumaça azulada com o canto da boca.
Sabe o que eu acho disso, Senior?! Falou com seu pior sotaque castelhano.
O quê..?
A fumaça saiu de seus lábios entreabertos, subindo lentamente, serpenteando até o teto e além.

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domingo, janeiro 15, 2006

Cinco coisas que vou fazer em 2006:

1. Trabalhar um pouco menos.
2. Aprender a fazer todo tipo de pães e biscoitos:
3. Comprar um bom saco de dormir e viajar.
4. Continuar tomando meus porres.
5. Arrumar um canto pra viver sossegado.
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